MPT consegue liminar em ação por morte de trabalhador haitiano que caiu de andaime

O trabalhador caiu de uma altura de aproximadamente 9 metros no momento em que pintava a fachada de uma empresa no Distrito Industrial, em Cuiabá. Laudo da Politec comprova as irregularidades apontadas pelo MPT na ação

30/06/2021 - O Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso (MPT-MT) obteve liminar em ação civil pública movida para responsabilizar as empresas BAMAQ Bandeirantes Máquinas e Equipamento (BAMAQ - New Holland Construction) e Z R P Pereira (Galego Manutenção e Reparos) pela morte de Peterson Dieujuste, de apenas 30 anos. Natural do Haiti, o trabalhador caiu de um andaime a uma altura de quase 9 metros enquanto realizava a pintura da fachada da BAMAQ, no Distrito Industrial, no dia 7 de março deste ano.

A ação tem por objetivo impedir a permanência das irregularidades no meio ambiente de trabalho que possam causar novos acidentes. O MPT também busca a defesa dos interesses de crianças e da companheira do trabalhador falecido, mediante pedidos que serão analisados futuramente pela Justiça do Trabalho, como indenização por danos materiais (pensão mensal) e compensação pelos danos morais individuais causados pela morte de Peterson Dieujuste, além do pagamento das despesas com funeral e luto da família. O pedido de condenação das rés ao pagamento de dano moral coletivo também só será analisado posteriormente, em sentença.

As fotografias e informações contidas no laudo pericial produzido pela Perícia Oficial e Identificação Técnica (Politec) mostram uma série de violações a normas de segurança e saúde do trabalho, notadamente aos dispositivos das Normas Regulamentadoras nº 18 e nº 35 (NR-18 e NR-35) do Ministério da Economia. “Os fatos extraídos do laudo pericial permitem concluir que as normas para utilização de andaimes e para trabalho em altura estavam sendo violadas de forma generalizada e grave, criando as condições para a ocorrência do acidente que ceifou a vida de Peterson”, afirma o MPT.

Os trabalhadores não estavam capacitados para realizar o trabalho em altura nem tinham sido submetidos a exames médicos para avaliar patologias que pudessem provocar mal súbito ou quedas. A falta de avaliação médica pode ter contribuído decisivamente para a morte de Peterson, pois ele teria passado mal antes de cair. Mesmo assim, outras medidas de proteção poderiam ter evitado a queda de quase 9 metros de altura. Análise de risco, permissão de trabalho e dimensionamento do andaime por profissional legalmente habilitado são algumas das várias medidas que as empresas deveriam ter providenciado antes da instalação do andaime, mas não o fizeram.

O laudo demonstra as condições precárias de segurança do andaime móvel, dotado de rodízios (rodinhas para permitir o deslocamento) e instalado em superfície desnivelada e inclinada, situação vedada pela NR 18. O andaime não cumpria exigências mínimas de segurança como possuir meios de acesso seguros, piso de forração completa e sistema de guarda-corpo e rodapé em todo o perímetro.

“Em resumo, o andaime precisava ser interditado. As rés não providenciaram aos trabalhadores as condições para que realizassem o trabalho em altura nem observaram as medidas mínimas para utilização de um andaime, o que resultou na perda precoce de uma vida, uma morte totalmente evitável”, lamenta o MPT. Além disso, a plataforma com piso estava sem trava, de modo que o piso não apenas estava com a forração incompleta, mas também estava solto. “Nenhum profissional legalmente habilitado atestaria a regularidade de um piso de andaime nessas condições”. 

Quanto aos equipamentos de proteção individual, o MPT afirma que não havia definição de local para ancoragem do cinto nem avaliação da adequação do EPI para o serviço, tampouco foram fornecidos treinamento e instruções para uso do cinto. “Não adianta haver cinto de segurança se não for indicado local onde se possa ancorar o cinto para subir nos andaimes e realizar o trabalho em altura. Além disso, a falta de treinamento para uso de EPI e para trabalho em altura inviabiliza a utilização correta desses equipamentos. Era obrigação das empresas exigir o uso do EPI, e esse uso dependia de análise de risco, sistema de ancoragem e de treinamento, medidas prévias totalmente inexistentes, assim como diversas outras que foram flagrantemente desrespeitadas”.

O MPT também aponta que os dois trabalhadores que realizavam a pintura não estavam registrados, de modo que Peterson Dieujuste estava desamparado pela Previdência Social, o que pode impedir a família de receber pensão por morte previdenciária. Essa irregularidade fragiliza a segurança do trabalho, uma vez que trabalhador sem carteira assinada acaba sendo preterido nas medidas de prevenção de acidentes. “Por estar fora dos sistemas da empresa, não aparece documentalmente durante uma fiscalização. Ele só acaba aparecendo para a fiscalização quando sofre acidente grave ou fatal. Se a empresa sequer assina sua CTPS, a chance de não lhe proporcionar medidas de prevenção de acidente só aumenta. Afinal, se não é feito o mais básico, que é a formalização do vínculo de emprego, muito menos serão fornecidos treinamentos para um trabalhador informal nem serão dispendidos gastos de segurança em relação a alguém que nem mesmo se encontra registrado na empresa”.

Para o MPT, tanto a Z R P Pereira como a BAMAQ devem ser responsabilizadas solidariamente pelo descumprimento das normas de segurança e pelo acidente ocorrido. Apesar de a primeira ser a empregadora, e a segunda, a contratante do serviço, o meio ambiente laboral é indivisível e deve ser protegido independentemente da natureza do vínculo com o trabalhador. “As empresas foram responsáveis por utilizar andaime em condições proibidas, configurando situação de risco grave e iminente, e por ilicitudes que aconteceram antes da instalação do próprio andaime”.

Obrigações

Na decisão do dia 25 de junho, o Juízo da 9ª Vara do Trabalho de Cuiabá pontuou que o laudo da Politec confirma as irregularidades apontadas pelo MPT na ação. “As provas carreadas aos autos evidenciam, portanto, que as rés descumprem reiteradamente as normas básicas de saúde e segurança do trabalho. In casu, o autor relata que instaurou o Inquérito civil n. 000103.2021.23.000/5 e notificou as rés a fim de apresentarem documentos com vistas a comprovarem o saneamento das irregularidades, contudo, estas permaneceram inertes, a revelar o desinteresse em cumprir as normas básicas de saúde e segurança do trabalho”.

As empresas deverão cumprir, sob pena de multa, 13 obrigações, entre elas avaliar periodicamente o estado de saúde dos trabalhadores que exercem atividades em altura; proibir e impedir a realização de trabalho em altura sem prévia análise de risco; utilizar sistema de proteção contra quedas sempre que não for possível evitar o trabalho em altura; dotar os andaimes de acesso seguro e de sistema de guarda-corpo e rodapé em todo o perímetro; promover, antes que assumam sua função, treinamento teórico e prático dos trabalhadores para trabalho em altura; e efetuar, por meio de profissional legalmente habilitado, o dimensionamento dos andaimes, sua estrutura de sustentação e fixação.

A inobservância das obrigações sujeitará as empresas ao pagamento de multa mensal de R$ 30 mil por obrigação não cumprida no prazo determinado, sem prejuízo de majoração em caso de reincidência. As multas são cumulativas.

Além dessas 13 obrigações, a empresa Z R P Pereira deverá cumprir, ainda, outras duas: abster-se de admitir ou manter empregado sem o respectivo registro em livro, ficha ou sistema eletrônico competente; e anotar a CTPS do empregado, no prazo de 5 dias úteis, contado do início da prestação laboral. A multa estabelecida é de R$ 10 mil por trabalhador irregular.

ACPCiv 0000381-82.2021.5.23.0009

Informações: Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso (MPT-MT)

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